É
bastante comum vermos pessoas afirmando que não gostam de matemática.
Provavelmente, você conhece várias – e pode até mesmo ser uma delas.
Claro, não há problema algum em não ter afinidade com a matemática (ou
com qualquer outra área do conhecimento). A questão é que, muitas vezes,
esse desinteresse é causado pela forma como o conteúdo nos é ensinado e
isso faz com que muitos estudantes se distanciem dessa ciência sem
sequer terem a chance de conhecê-la com mais profundidade.
Professor da University of Frankfurt,
David Kollosche pesquisou, na Alemanha, as razões desse distanciamento,
quais seus riscos e como esses estudantes se sentem com relação à
matemática. Ele apresentou seu estudo, intitulado Auto-exclusion in mathematics education (auto-exclusão na educação matemática),
no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em
São Carlos, no fim de setembro. Apesar de ter sido aplicado na Alemanha,
o professor afirma que os resultados obtidos na pesquisa podem ser
semelhantes em outros lugares do mundo.
Segundo
ele, o medo que muitos estudantes estabelecem com a matemática pode até
resultar em uma relação de dominação. “Um grande grupo de pessoas
aprende que a matemática não é para elas. Silenciar pessoas dessa forma
pode servir como função sociopolítica e econômica”, afirma.
Em
sua pesquisa, realizada com 199 estudantes do ensino fundamental, ele
constatou que mais de um terço dos estudantes têm uma relação negativa
com a matemática. Essa negatividade pode levar à chamada auto-exclusão,
que inclui três categorias de distanciamento do aluno da educação
matemática: a exclusão física, quando o aluno deixa de ir às aulas; a
passividade intelectual, quando ele apenas “passa” pelas aulas; e a de
incapacidade, que é quando o estudante assume que não tem habilidade
matemática.
Com
o questionário aplicado aos estudantes durante a pesquisa, David
identificou as razões pelas quais os alunos não gostam da área e,
consequentemente, os motivos pelos quais se auto-excluem da matemática.
“Uma prática de ensino humilhante ou sua falta de individualização pode
levar à auto-exclusão, que acaba sendo intensificada pela forma de
ensino”, explica David.
Então,
se o problema está na escola, como pensar em formas de melhorar o
ensino e deixar a matemática mais interessante para os estudantes? O que
está sendo estudado nessa área para que os alunos não se auto-excluam
antes de terem a chance de conhecê-la?
Explorar sem sair da escola - Quando
uma professora do ensino fundamental sentiu que seus alunos estavam
pouco participativos nas aulas, percebeu que era hora de agir e mudar.
Estamos falando de Lucimar Mascarin, que é professora de matemática em
uma escola estadual de Divinolândia, no interior de São Paulo, e
formou-se no Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional
(PROFMAT), no ICMC, em setembro deste ano.
Em
sua tese, ela realizou uma pesquisa-ação com alunos do 9º ano de sua
escola, em que desenvolveu técnicas lúdicas e exploratórias para
melhorar o ensino matemática. Mais do que mostrar que é preciso mudar
algumas técnicas de ensino, sua tese demonstra que não precisam ser
realizadas atividades complexas para aumentar o engajamento dos alunos. A
escolha da classe foi feita com base em dois motivos: a dificuldade em
aprender matemática e o desejo de ter aulas diferentes. “No geral, eram
alunos que, em questão de aprendizagem, apresentavam grande potencial de
evolução. A sala iniciou o ano letivo com pouca participação, mas após
alguns meses já conseguiam se organizar melhor e participar da rotina”,
afirma Lucimar.
O
enfoque de sua pesquisa foi a trigonometria e, para isso, ela
desenvolveu diversas iniciativas. Entre elas, estava a criação de
triângulos em papel para compreender os conceitos de relação entre
triângulos e a realização de atividades experimentais fora da sala de
aula. Ela levou os alunos para diversos lugares da escola com o objetivo
de medirem a altura das construções e postes, utilizando um teodolito
confeccionado pelos próprios estudantes. Com as informações adquiridas,
eles voltaram à sala de aula para realizarem os cálculos e, assim,
comprovarem teorias.
Lucimar
também convidou o pai de um dos alunos, que é marceneiro, para explicar
como utiliza conceitos matemáticos em sua profissão. “Com essas
atividades, os alunos puderam relacionar a trigonometria com problemas
da vida prática, gerando significados culturais para os conhecimentos
escolares. Além disso, com as entrevistas, puderam confirmar o uso da
matemática na prática profissional”, explica.
Fora
da sala de aula, a professora também fez com que os alunos medissem
superfícies circulares, para que calculassem circunferência e diâmetro
e, assim, compreendessem a teoria na prática. Já dentro da sala de aula,
Lucimar levou o jogo “trigominó”, uma espécie de dominó onde as peças
possuem funções trigonométricas.
Entretanto,
apesar dos resultados positivos, Lucimar alerta para a forma com os
métodos devem ser empregados: “esse tipo de abordagem toma um tempo
considerável para trabalhar os conteúdos matemáticos. Por isso, devem
ser mesclados a outras metodologias, pois cada uma tem seu benefício.
Cabe ao bom professor diagnosticar, avaliar e tomar essas decisões”.
Geometria na palma da mão - Outra
pesquisa que apresentou técnicas alternativas de ensino e também foi
realizada no ICMC durante o PROFMAT foi a de Marília Tridapalli. Ela se
formou no mestrado em março deste ano e apresentou um trabalho com práticas de ensino de geometria utilizando origami modular.
Para
promover a aprendizagem da geometria, ela utilizou o origami, que pode
ser um recurso manipulável bastante eficaz. “O aluno precisa ter o
contato com as formas geométricas que constam nos livros didáticos para
que concretize aquela ideia que, até então era abstrata, pois estava
apenas desenhada”, diz a pesquisadora, que montou os chamados poliedros de Platão utilizando origamis modulares, que são formados pelo encaixe de vários papéis iguais ou simétricos.
Marília
acredita que os resultados obtidos com o origami modular podem
contribuir muito para o ensino da geometria no ensino fundamental,
porque desperta o interesse e a curiosidade dos alunos por meio de
objetos manipuláveis e elaborados por eles mesmos. “O professor pode
criar suas próprias práticas e diversificar suas aulas. As sugestões são
uma pequena parte do grande leque de possibilidades de aplicação desses
objetos”, conclui a professora.
Assessoria de Comunicação ICMC/USP